Pular para o conteúdo principal

Destaques

Segredos Ditos à Luz do Crepúsculo

O vento acariciava suas crinas cor-de-avelã enquanto tamboreiavam a terra com seus cascos. Seus olhos sombrios e brutos refletiam o róseo do horizonte, que era interrompido apenas pelo dourado do sol escapando por dentre as nuvens. Dentes-de-leão dançavam ao vento e grudavam em suas pelagens. Não sentiam fragrâncias, pois suas narinas apenas captavam o frio do inverno que se aproximava. Corriam em direção ao que restava de sol. Eram, como é próprio de sua natureza, livres. Distante dali, restava o cavaleiro. O homem portava uma longa barba e utilizava vestes coloridas e suntuosas que, na sociedade dos homens, indicavam uma posição de estima e respeito. Estas, no entanto, estavam gastas, desbotadas e batidas - era evidente que havia muito tempo desde a última vez em que o cavaleiro adentrara os grandes salões que reconheciam o significado dos seus trajes. Salões estes que já haviam deixado a materialidade e residiam agora apenas em memórias e delírios. Sentado aos pés da fogueir...

FLCL:VESPA, ROBÔS, BAIXO ELÉTRICO E UMA MULHER DE CABELO ROSA

 


No dia 26 de abril de 2000 estreava na TV Japonesa uma animação feita por gigantes do mercado: um time composto por funcionários da Gainax, da I.G Production e da Starchild Records. A história segue uma premissa comum em vários animes: o amadurecimento e o preparo para a vida adulta.

O que faz de FLCL especial? Essa pergunta é respondida logo no primeiro episódio, quando uma mulher de cabelos cor-de-rosa, andando em uma Vespa, acerta a cabeça de um garoto com um baixo elétrico e, graças a isso, robôs e outros objetos começam a emergir da testa dele que está ligada à maior fábrica da cidade, e que por acaso, tem o formato de um ferro de passar.

FLCL é estranho, às vezes confuso, mas sempre interessante. Seus 6 episódios de 20 minutos são cheios de referências a outras obras, experimentações visuais e ótimos personagens.

A dinâmica central gira em torno de Naota, um garoto cansado da monotonia em sua cidadezinha. Ele convive diariamente com Mamimi, a namorada de seu irmão. Ela usa o garoto apenas como substituto de seu namorado, que agora joga baseball nos Estados Unidos.

A vida de Naota vira de ponta cabeça quando Haruko, a mulher de cabelos cor-de-rosa já mencionada, surge na cidade. Haruko é uma alienígena que está usando a testa de Naota para tirar objetos de dentro da fábrica, e assim liberar um pirata espacial chamado Atomsk. Mas isso pouco importa, o verdadeiro foco da trama é o efeito que o convívio com Haruko tem em Naota.

Haruko faz com que Naota se torne uma pessoa independente mesmo que isso signifique se afastar de Mamimi e da expectativa que ela depositava nele. Naota se torna dono de si mesmo e, principalmente, aceita não estar no controle de todas as situações, assim como o público aceita não entender todos os aspectos da trama. Dessa maneira, FLCL consegue de forma metalinguística fazer o espectador passar pelo mesmo ciclo de aprendizado que o protagonista.

Como em qualquer obra de arte, é impossível desassociar FLCL do cenário em que ele está inserido. No caso da obra em análise estamos falando da cultura dos animes, mais especificamente a cultura dos animes no início dos anos 2000.

Essa é uma cultura bastante problemática, pois, apesar de o meio ser responsável por diversas obras incríveis que discorrem sobre os mais diversos temas, o público tende a preferir séries cheias de clichês que não trazem nada de novo para essa mídia. Talvez isso seja um problema comum ao entretenimento em geral (mais sobre isso em um futuro texto), mas é uma característica extremamente perceptível dos animes.

FLCL quebra com as expectativas do público ao subverter os clichês da mídia:  a história de amadurecimento não é sobre se tornar forte ou poderoso, mas sobre entender seu lugar no mundo. As personagens femininas não giram ao redor do protagonista e, assim como ele, apresentam um desenvolvimento emocional. Mamimi, por exemplo, abandona a ideia de seu namorado idealizado e para de manipular Naota emocionalmente, já Haruko passa a respeitar o protagonista. Outra quebra de clichês interessante é a opção do roteiro por não utilizar algum adulto como figura exemplar para o personagem principal, pelo contrário, na trama os adultos servem como exemplo do que não se tornar.

A experimentação visual complementa a narrativa ao representar uma quebra com as tradições dos animes, misturando animação 2D e 3D, tendo uma sequência inteira em forma de mangá e mudando constantemente o estilo visual da obra.

FLCL é acima de tudo sobre desafiar o status quo dentro e fora da história, por isso a obra se recusa a utilizar de técnicas de narrativa comuns, optando pela quebra de padrões tão necessária em uma indústria cada vez mais marcada pelo comum, seguro e usual.

Me segue nas minhas redes sociais:

Instagram

Twitter

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas